2017/02/16

Sobre Eutanásia




A EUTANÁSIA SEGUNDO PEDRO VAZ PATTO — (por Factos, ficção e filosofia in Facebook)
Há algumas semanas, a revista Sábado destacou o testemunho de um médico que eutanasiou quatro pessoas. Tornou-se assim público algo que, na verdade, já se sabia: a eutanásia é uma realidade em Portugal. Em resposta a esse testemunho, Pedro Vaz Patto (PVP) escreveu um artigo – aquele que está ali em baixo – onde avança algumas das objecções recorrentes à legalização da eutanásia. Vale a pena expor a sua fragilidade.
Tendo em mente a eutanásia voluntária, PVP alega o seguinte:
“[N]unca é absolutamente seguro que se respeita a vontade autêntica de uma pessoa que pede a eutanásia. Nunca pode haver a garantia absoluta de que o pedido de eutanásia é verdadeiramente livre, inequívoco e irreversível. Muitas vezes, traduz um estado de espírito momentâneo, que pode ser superado.”
Quem defende a eutanásia voluntária, entende que esta deve ser praticada apenas quando o paciente exprime, sem coerção, um desejo competente de morrer — ou quando, estando incapacitado, exprimiu competentemente esse desejo a respeito das circunstâncias em que agora se encontra. Para PVP, no entanto, a eutanásia deverá estar fora de questão na ausência de uma “garantia absoluta” de que o desejo é competente. O problema é que esta exigência, tão forte que nunca poderá ser satisfeita, acaba por resultar no seguinte: vamos, então, tratar o paciente como se tivéssemos a garantia absoluta de que ele é incompetente. Assim, se uma pessoa estiver muito doente ou incapacitada, sofrerá ainda o infortúnio de ser tratada como se já não fosse um agente racional, como se a sua vontade a respeito de algo que lhe concerne primariamente (o modo como a sua própria vida irá terminar) nada contasse.
A exigência de PVP é descabida. Como devia ser óbvio, estar muito doente ou fisicamente incapacitado não implica cair num estado de perturbação mental que nos prive de fazer escolhas competentes. Em muitos casos, havendo um pedido de morrer expresso com lucidez ao longo de um período de tempo considerável, temos razões suficientemente fortes para julgar que esse pedido é competente. O ónus da prova, aliás, caberá a quem duvide desse juízo. Diria até que as pessoas têm o direito moral a uma presunção de competência – i.e. que tratá-las como incompetentes, na ausência de razões suficientemente fortes para crer na sua incompetência, é fazer-lhes uma injustiça.
Por que razão, então, se há-de exigir uma “garantia absoluta” de competência, impossível de satisfazer? PVP sugere que a irreversibilidade da eutanásia torna essa exigência apropriada. “É que a decisão de suprimir uma vida”, afirma, “é a mais absolutamente irreversível de quaisquer decisões, dela nunca pode voltar-se atrás.” Acontece que as coisas não são tão simples. Suponha-se que, sem nenhuma razão para considerar incompetente um pedido de eutanásia, recusa-se esse pedido e condena-se a pessoa que o fez a agonizar durante semanas. Todo esse sofrimento que ela terá de suportar — em virtude de a tratarem como se estivessem certos da sua incompetência — também será absolutamente irreversível.

http://www.sabado.pt/vida/detalhe/eutanasia_a_morte_nunca_e_resposta

http://www.sabado.pt/vida/detalhe/eutanasia_o_direito_de_dizer_nao_ao_sofrimento


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